quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Exposição do Grupo Rosa dos Ventos








A exposição “+papel”, coletiva das artistas do Grupo Rosa dos Ventos (UDESC/CNPq), apresenta uma reflexão acerca da materialidade do papel como veículo poético. Buscando dar forma a memórias e relações com esse material, as artistas exploram desde as mais íntimas e delicadas lembranças até relações com o outro e com a paisagem.

Algumas artistas exploram a materialidade do papel dobrando-o, empilhando-o e montando jogos por meio do recorte de letras. Por intermédio desses arranjos, criam mundos imaginários em mini-instalações, celebram os encontros, usam a metáfora do empilhamento como forma de compreender o adensamento de memórias causado pela passagem do tempo, e ainda remetem-nos a experiências lúdicas envolvendo o papel. A ideia de perda e recuperação da memória também está implícita na tentativa de fixar uma imagem em papel por intermédio do ato fotográfico. Alguns trabalhos evocam relações com a paisagem, como as gravuras em papel que são apresentadas junto a conchas coletadas num passeio pela praia.

Juliana Crispe convidou a amiga Bruna Mansani para brincar. “Um mundo de papel para Alice” mostra a personagem, pequena boneca de pano, de 1,5 cm, que dá nome à série iniciada em 2007, interagindo com pequenos animais, objetos em origami, produzidos por Bruna, na proporção da personagem. É a primeira vez que Alice, antes protegida por fotografias, aparece em cena.

Juliana Crispe, Um mundo de papel para Alice, 2009-2011
Instalação, origamis e Alice


O lúdico e o encontro se manifestam também nos trabalhos de Maria Araujo e de Rosana Bortolin. A partir de saquinhos de chá saboreados em um encontro entre amigas, Maria Araujo se lança ao jogo da conversa, da oferenda, do pottlach, devolvendo os restos do ritual, os saquinhos já utilizados, com marcas do uso e tingimento com pigmentos naturais e industrializados.

Maria Araujo, Casal, 2010
saquinhos de chá tingidos


“Papel de papel I e II”, de Rosana Bortolin, propõem uma alusão aos contatos lúdicos feitos com papel durante a remota infância. Recorte de letras, formação de palavras, empilhamento de papéis, criação de volumes. Folhas empilhadas, letras recortadas que unidas e ordenadas formam a palavra papel. O negativo do recorte e o positivo do recortado ao complementarem-se formam uma folha inteira. Segundo a artista, “é uma metalinguagem que define o conceito do objeto por meio do material do qual ele é feito”. O visitante poderá retirar esses recortes e levar consigo para montar e remontar.

Rosana Bortolin, Papel de papel I, Papel de papel II, 2009-2011
pilhas de letras de papel formando a palavra papel

“Sementeira”, obra de Sandra Correia Favero, segue outra linha. Considerando as inúmeras possibilidades de reprodução de imagens, a artista expõe a disseminação da estampa resultante de um processo secular sujeito ao abandono dentro de uma caixa forrada com conchas e caramujos. Sandra explica: “porque vivo em Sambaqui, sei o quanto estamos tentados a levar para casa essas pequenas “lembranças”. Sei o valor afetivo que elas incitam. As estampas estão colocadas ali como oferenda ao público e como estímulo a multiplicação do ato de gravar.”

Sandra Correia Favero, Sementeira, 2005
instalação com caixa de vidro, conchas e caramujos, cascas de ostras e mariscos,
estampas impressas a partir de matriz xilográfica


A memória é tema ainda dos trabalhos de Márcia Sousa e Marina Moros. “palimpsesto 1 [Helena]”, de Márcia Sousa, incita o espectador ao tato, à experiência do empilhamento de memórias e à sua recriação, originada no próprio gesto de empilhar. Um palimpsesto é uma página manuscrita, pergaminho ou livro cujo conteúdo foi apagado (mediante lavagem ou raspagem) e reescrito, normalmente nas linhas intermediárias ao primeiro texto ou em sentido transversal. Como num palimpsesto, a memória reescreve constantemente os fatos vividos. Camadas de espaços-tempo que se interpenetram e se transformam mutuamente. Por entre as linhas dessa escrita sempre transformada, é possível entrever as camadas inferiores, indícios do vivido. O trabalho de Márcia presentifica essa sobreposição, esse adensamento de memórias. O ato de empilhar reafirma a ideia de acúmulo e de entrelaçamento entre camadas. A transparência dos papéis permite a contaminação entre palavras, entre lembranças, entre tempos, entre espaços. Sob a escrita revelam-se outras escritas. O visitante poderá mover as folhas para desvendar o trabalho e experimentar a sensação de adensamento provocada pela ação de empilhar.

Márcia Sousa, palimpsesto 1 [Helena], 2009-2011
papéis transparentes empilhados, escrita em nanquim

Marina Moros joga com a etimologia das palavras “retrato” e “res”, para discutir, na obra “[restraho]”, o intervalo em que a imagem vira tangência nas armadilhas criadas pela fotografia pixográfica, onde a latência é substituída por jatos.

Marina Moros, [restraho], 2009-2011
fotografia, adesivo em vinil sobre parede, texto

Em “ser (des)contínuo”, Silvia Carvalho mostra uma série de quinze desenhos-pinturas feitos com bastões oleosos e tinta de terra sobre papel. São figuras femininas criadas a partir de leitura do livro "O Erotismo" de Georges Bataille.

Silvia Carvalho, ser (des)contínuo, 2009
desenhos sobre papel, instalados em sequência

A exposição “+papel”, do Grupo Rosa dos Ventos, pode ser visitada até o dia 6 de fevereiro.


Serviço

Exposição “+papel”

Museu Histórico de Santa Catarina, Palácio Cruz e Sousa
Praça XV de Novembro, 227. Centro. Florianópolis, SC.
Tel: (48) 3028.8091; e-mail: mhsc@fcc.sc.gov.br;
www.mhsc.sc.gov.br
Visitação: 14 de janeiro a 6 de fevereiro de 2011; terça a sexta-feira, 10 às 18h; sábado e domingo, 10 às 16h.

2 comentários:

Michal disse...

O acesso à exposicao teve que ser virtual pela distância. Parabéns ao grupo, deve estar demais! Abraços! Michal

Katia Horn disse...

oi marcia,
gostei muito do seu blog, e devo voltar aqui mais vezes, pq s'o andei pelas imagens, e tem mto texto legal pra ser digerido. tb'em adoro papel, e brinco muito com suas possibilidades. lembrei de umblog q postei no meu blog pirata, que creio, vc vai gostar: http://imagempirata.blogspot.com/2010/11/urban-sketchers.html
ha muitas outras coisas com papel por la, de uma viajada.
grande abraço, katia